domingo, 25 de setembro de 2016

Plyometrics: O jogo do "estica-encolhe"

"He is alive!"
Bem, peço desculpa pelas 2 semanas sem "postar" nada. Com o recomeço da faculdade e um ou outro projecto coincidente, tenho tido pouco tempo para dedicar ao blog. Mas nada como receber um pedido especifico de tema, para interromper este jejum!
Há uns dias o João Oliveira (http://runjoaorun.blogspot.pt/) sugeriu-me que abordasse o tema do treino pliométrico. E é realmente algo que pode ser muito útil, não só a quem procura melhorar a sua performance, como para quem está na fase final da reabilitação de algum tipo de lesão, e vou explicar mais à frente porquê.
Queria só começar por desmistificar algo: acho que hoje, que está bastante em voga o conceito de exercício com o peso do corpo, ou seja, sem utilização de pesos externos como resistência aos movimentos treinados, tende a haver uma confusão e equiparação de pliometria e treino calisténico. São brutalmente diferentes? Não. Ambos usam o peso do corpo. No entanto, o treino calisténico serve predominantemente para a tonificação e não requer qualquer material extra. Além disso, é caraterizado pelo movimento controlado e equivalente, tanto na fase excêntrica como concêntrica. O pliométrico serve para o ganho de potencia e explosividade, muitas das vezes requer material como caixas, degraus, ou outros que sirvam ao propósito do treino. Aqui, o movimento excêntrico (quando o músculo estica) vai servir à acumulação de energia elástica, que é logo após libertada numa contracção (quando o músculo contrái/encolhe) explosiva, um fenómeno muitas das vezes chamado como "momentum" .


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Qual é melhor? Bem, depende do objetivo e condição da pessoa. Vejamos, um atleta: de modo geral (claro que diferentes desportos têm diferentes exigências, mas vejamos casos como futebol, futebol americano, atletismo, vólei, etc), a tonificação surge com o normal trabalho muscular, mas o principal foco é a explosividade, é esta que vai contribuir grandemente para uma maior performance. É isso que permite ao Usain Bolt ter o poder de arranque que tem, ao Nélson évora saltar o que salta, aos ginastas conseguir alcançar a com tão pouco tempo de contacto com o solo, alturas suficientes para realizar as coreografias que delineiam.
Agora vejamos outro caso: estamos perante um bodybuilder ou competidor na categoria de physique. O seu objectivo é acima de tudo estético, é a tonificação mesmo que esta não se traduza num incremento substancial da funcionalidade. Neste caso o treino calisténico é uma possibilidade mais adequada. Mas uma metodologia, não invalida a utilização da outra para acoplar á tonificação a potência e funcionalidade.
Um exemplo prático: flexões (se bem que o mesmo é aplicável ao agachamento, por exemplo).  A maneira mais eficaz de tonificar, será descer até ao momento em que os braços e antebraços fazem um ângulo de aproximadamente de 90º, parar (perda da energia elástica/momentum), e voltar a subir até à posição inicial; se o propósito for o ganho de explosividade, a descida pode ser igualmente controlada mas perto dos 90º há uma aceleração da fase excêntrica (fase em que é ganha a energia elástica/momentum), e sem parar, se inicia logo de seguida a subida.
Vejamos por exemplo um jogador de vólei: não salta à rede de imediato, começa por dobrar os joelhos, acumula energia elástica, e logo de seguida salta, pois se pausasse no final da descida, perdia toda essa elasticidade ganha.



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Agora, no inicio do post referi que o treino pliométrico é bastante eficaz numa fase final de reabilitação. Isto porque contribui pelas suas características para o ganho de força, mas o facto de parte do movimento ser auxiliado pelo "momentum", retira algum "stress" da articulação em causa. De certo modo, o treino pliométrico funciona muito à base dos princípios físicos da mola, com a diferença de que a energia elastica da mola é acumulada quando este encolhe e libertada quando estica, o oposto do que acontece nos músculos
Já o treino calisténico, procura eliminar o "momentum", o que provoca maior stress articular porque não há qualquer ajuda na transição da fase em que o músculo está a alongar, para o momento em que passa a encurtar.
Por isto é que maior parte das vezes quando estamos a fazer algum movimento e a força começa a escassear, começamos a procurar inconscientemente retirar proveito desse efeito elástico, para conseguir realizar mais uma ou duas repetições daquilo que for que estamos a fazer.

Portanto, de um modo geral: o treino pliométrico fortalece (ainda que em relativamente menor escala que o treino calisténico), ajuda a recuperar e a evitar lesões pela facilitação do movimento através da rápida sucessão "estica-encolhe" do músculo, e ainda, como normalmente os exercícios utilizados não são de "isolamento", ou seja, trabalham mais do que um grupo muscular simultaneamente (agachamentos: quadricpite, glúteo, core, e ainda os isquio-tibiais como estabilizador do movimento apartir dos 90º), resultam numa maior capacidade funcional e condicionamento físico, ajudando a perder gordura e  tonificar (se bem que em menor escala do que o treino calisténico).
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Exemplo de exercicio calisténico



Para finalizar, quando deve este tipo de treino ser realizado?
De modo geral, é uma rotina que pode (e deve) ser mantida "all year round", o que deve variar é a frequencia e intensidade. De modo geral, no inicio de uma época desportiva, o objetivo é criar uma base forte e robusta para aguentar os períodos de carga que se avizinham. Por isto, e de modo a não contrair lesões logo na pré época, o treino pliométrico é inidicado com uma frequência de, digamos, 3/4 vezes por semana, com intensidade moderada. Já no decorrer da época, é bom manter o corpo com a capacidade explosiva e manter um constante fortalecimento muscular, mas que, em conjunto com a carga normal de treino não constitua excesso de volume, pelo que é aconselhável a diminuição da frequência para uma rotina mais na casa das 1/2 vezes por semana, em dias em que a carga do treino propriamente dita, seja compatível com uma intensidade acrescida do treino pliométrico.

Espero ter conseguido ajudar a distinguir melhor os dois conceitos, e ter ajudado na vossa escolha da rotina mais adequada para os vossos objetivos.
Se surgirem dúvidas ou existir outro tema que gostassem de ver abordado, sugiram!
Bons treinos e até ao próximo post!

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Treino intervalado: Saber escolher a árvore certa

Há duas semanas, o Miguel Heitor colocou-me uma dúvida interessante aqui no blog: porque é normalmente no primeiro mês a 2 meses de pré-época, se "descuram" os treinos intervalados (fartleks, tempo runs, séries, etc)?
Primeiro importa explicar que diferentes tipos de treino vão influenciar diferentes sistemas de energia e provocar diferentes adaptações fisiológicas. Consoante a finalidade do atleta, pode ser prescrito um treino de estímulo anaeróbio (intervalos tipicamente até aos 15'', com tempo de recuperação de 3 a 5', de maneira a permitir uma recuperação completa do último esforço); treino no VO2 máximo, cujo objetivo vai ser aumentar a eficiência do indivíduo na utilização de oxigénio (o vo2 designa o volume de oxigénio passível de ser captado e utilizado por um indivíduo a realizar uma determinada tarefa, em relação ao seu peso corporal, por minuto; normalmente é constituído por intervalos de 3 a 5' a um ritmo na casa daquele que o individuo usaria para uma prova de 3km, com intervalos entre repetições de 2' a 3', de maneira a permitir uma recuperação quase total); treino no limiar anaeróbio (tipicamente utilizado para atrasar a produção de lactato, ou seja garantir que a sua produção começa a ocorrer a ritmos mais exigentes do que é comum; é realizado através de treinos de 20 a 30' a ritmo constante e, consoante a experiência do atleta, entre o seu ritmo de competição de 10 a 15km, que ao fim de algum tempo pelo esforço se tornam anaeróbios na medida em que há um aumento da necessidade de oxigénio pela fadiga mas o corpo não consegue utilizar mais do que aquele que está a usar no momento, pelo que se inicia a produção do já referido lactato). Sobre este tema posso me vir a debruçar mais exaustivamente num próximo post se acharem interessante, mas agora vou passar realmente para aquilo que me foi pedido!
Não me querendo fixar só na componente da corrida, estes princípios são facilmente transpostos para o fitness: podemos trabalhar mais a força/explosividade, realizando sets de 1 a 5 repetições com 3 a 5' de intervalo; podemos trabalhar a hipertrofia, utilizando pesos que tornam a realização de 8 a 12 repetições o máximo de que somos capazes; ou podemos trabalhar mais a endurance muscular através de sets de 15 ou mais repetições, que nos levem ao limite da capacidade muscular e promovam aquela sensação de ardor no músculo recrutado.

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Então, se estes tipos de treino permitem aumentar a nossa eficiência, porque é que não trabalhamos mais cedo nestas intensidades ou volumes sub-máximos, e "perdemos" tempo primeiro com, na corrida, treinos de corrida contínua (o comum "meter km's") ou na componente do fitness, treinos com cargas e volume apenas moderados?
Normalmente toda a gente gosta do desafio, gosta de algo que não seja monótono e em que se sinta a progredir, e a corrida contínua e treinos com menor intensidade, não satisfazem esses desejos, em grande parte. Mas tendem a ser realizados em primeiro lugar. Porquê?
Após uma época de treino, é normal que o atleta esteja com o seu corpo no seu estado mais frágil, física e mentalmente, pelas micro lesões e fadiga de 8/10 ou mais meses consecutivos de treino e porque não é fácil animicamente passar uma época a perseguir objetivos, estar pronto a treinar mesmo quando a vontade não é muita ou nenhuma, estar a sofrer nos treinos ou ter resultados que não são os desejados e mesmo assim persistir focado no objetivo maior. Tiradas 2 semanas de repouso, perde-se algum condicionamento, claro, mas o corpo vai ter tempo para se regenerar nessas 2 componentes (física e mental). A desabituação do estímulo que é normal ocorrer, leva a que seja necessário primeiro reconstruir a base de treino, que vai dar a robustez ao corpo necessária para aguentar a intensidade cardiovascular e músculo-esquelética,(evitando lesões) inerente à realização de treinos intervalados. Além disso, permitir ao atleta que durante a sua "re-integração" no esquema de treino, possa treinar com intensidades mais reduzidas, vai contribuir para uma frescura mental que a longo prazo só pode ser benéfica. Se tiverem visto o post do Vítor Oliveira (www.aquelequegostadecorrer.com) esta semana, ele diz exactamente que neste momento se está a divertir a treinar. E considerando que mais para a frente certamente como é normal em qualquer atleta vão haver momentos de acumulação de cansaço mental, quanto mais o podermos retardar, melhor! Além disso, pelo esforço em que coloca o nosso corpo durante esse tipo de treino, o treino intervalado só tem benefícios até certo ponto, porque com a crescente intensidade, mais difícil vai sendo recuperar entre treinos, e mais difícil se torna no treino seguinte fazer melhor do que no anterior. Visto que um dos princípios da adaptação muscular é sobrecarga progressiva, sem sobrecarga (ritmos mais elevados), não ocorrem as melhorias desejadas.


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Daí até agora ser muito utilizada a frase :" winter miles, summer smiles". Na pré-época, procuram-se extrair todos os benefícios possíveis da corrida contínua. Quando estes deixam de promover melhorias na condição física do atleta, introduz-se o treino intervalado para que os benefícios deste só cessem numa fase já final da época (obviamente atletas com objectivos específicos e picos de forma programados para outros momentos da época, têm de esquematizar o seu treino de maneira diferente).

Como já é meu apanágio em relação a outros temas, vou só tentar fazer aqui uma analogia: imaginemos 2 árvores: a árvore da corrida contínua maçãs mais pequenas, já maduras; a árvore do treino intervalado está recheada de maçãs maiores, mas que ainda não estão prontas a serem comidas,
Resultado de imagem para 2 tree with apples
O objectivo de alguém com fome é comer o máximo de maçãs possíveis (equivalente a obter os resultados desejados), e ás vezes, nessa ânsia, o comum é que a pessoa tenda a partir logo para a árvore do T.I. . Resultado: inicialmente fica bastante saciada, pelo tamanho e quantidade que comeu. Mas mais à frente, quando tiver fome, não só já não tem maçãs nessa árvore, como as da corrida contínua já apodreceram...


Conclusão: o objectivo é ser mais racional do que emocional, pensar a médio/longo prazo e não tanto nos resultados imediatos: começar pela corrida contínua e obter todos os benefícios em termos de condicionamento e habituação do corpo ao estímulo porque estes não vão comprometer ganhos futuros; depois procurar "afinar o motor" através da utilização de treino intervalado.

Espero que não tenha sido uma metáfora muito rebuscada! Se tiver sido ou se tiver ficado alguma dúvida ou houver algum tema que gostassem que tivesse coberto mais exaustivamente ou venha a cobrir numa próxima oportunidade, sugiram!

Até um próximo post!!